sexta-feira, 30 de junho de 2017

ENIGMA EXISTENCIAL





Bastaria existir a Via Láctea no inexplicável Universo para caracterizar o absurdo da existência humana na Terra. Porque todos os conceitos existenciais esbarram nesta invencível constatação do absurdo, tal como é absurdo o suicídio no dizer de Albert Camus; sim, mesmo que tudo seja irrealidade, e que a existência humana não passe de ilusão, nós, mortais, supostamente pensantes, insistimos em distinguir o natural do sobrenatural, ignorando o primeiro por ser complexo e cultuando o segundo por imitação de rebanho. Olvidamos o natural também porque a ciência e a filosofia não ultrapassaram o limite do “só sei que nada sei”. Resta-nos, talvez, o sobrenatural como via de escape. Mas quando nos remetemos a ele em profundidade vemo-lo tão incrível quanto o natural. Alenta-nos, nesta hora de difícil opção, a Fé na existência de uma Entidade criadora do Universo, ou de Multiversos, tanto faz. Mas o absurdo insiste em nos atordoar, e nem sempre a Fé em Deus o supera. Sorte daquele cuja Fé é capaz de transpor todos os absurdos imagináveis e inimagináveis.

Tornando ao enigma de crer ou não crer (quiçá um dilema), imaginar que o Universo sempre existiu ou que teria nascido dum Nada, sem intervenção divina, não dirime a dúvida fundamental, e cá nos mantemos diante o absurdo. Mais enigmático ainda é conceber esse Nada anterior à criação do Universo e aceitar como verdade insofismável a existência de uma Entidade criadora fora desse Nada representado pela ausência de tempo, e espaço, e energia, e matéria e Tudo. Essa Entidade, claro, é nosso Deus ocidental, ou seriam as Entidades de outras denominações que sabemos imperar mundo afora.

Cada qual com sua Verdade!... Enfim, qualquer via de escape sobrenatural nos leva ao absurdo e nos trancafia no maior de todos os absurdos: nossa efêmera existência física por obra de Deus. Ah, não crer na Criação é absurdo! Por outro lado, crer na Criação é também absurdo! Enfim, só nos é dado crer no absurdo ou nos entregarmos a uma Fé tão convicta que dispensa absurdos. Sorte de quem a possui no seu espírito, se é que existe, e eu tendo a crer que sim, para sorte minha. Mas não excluo do meu pensamento o absurdo que permeia esta Verdade em mim, atordoando-me.

Pensar na existência humana a partir da Criação significa aceitar a racionalidade diferenciadora dos animais e dos vegetais e crer em Deus. Tal posicionamento me parece menos absurdo do que crer na Evolução a partir de um Big-Bang cuja teorização somente tem servido para afagar egos científicos muito além do entendimento do povo simples da Terra... Hum, que racionalidade é esta a que me refiro?... Será que é a que conduz este texto sem pé nem cabeça?...

Como saberemos, enfim, se realmente raciocinamos? Quantos movimentos repetitivos executamos enquanto supostamente raciocinamos? Por que há tanta semelhança biofísica entre humanos e animais? Como negar tantas outras similitudes orgânicas entre seres humanos e animais? Bem, a diferença estaria no exercício da razão, apenas, pois a emoção afeta também os animais, e cada qual a manifesta do seu modo repetitivo, que chamamos instinto e também o manifestamos muitas vezes. Sim, a emoção afeta o nosso corpo físico e psíquico, sim, e a repetição dessa emoção é comum aos humanos e aos animais. Ou seria mais um absurdo que aqui grafo em dúvida angustiante?...

Hoje a mecânica quântica absurdamente assegura que a pedra pensa. E agora? Que dizer disso? Será que os cientistas enlouqueceram? Não, não enlouqueceram, somos nada mais que átomos a transmigrarem de um para outro corpo mineral, vegetal ou animal ao longo de sua existência, seja efêmera ou eterna. Sim, para o átomo não há contagem de tempo, parece-me eterno. Aliás, tudo que existe apenas representa o que conceituamos em relação ao que sentimos ou não sentimos, bem como imaginamos que as demais coisas ou pessoas sentem ou não sentem. É tudo, afinal, clichê de comunicação repetitiva, tal como fazem os animais para se comunicar abrindo asas, balançando rabos, emitindo sons etc. É tudo átomo!...

Vivenciamos um mundo absurdo. Praticamos o absurdo desde o nascimento até a morte, com ressalva de que no prelúdio de nossas vidas comemos e borramos como quaisquer animais irracionais. Sim, somos instintivos na maior parte do tempo, este que aparentemente nos transforma em seres pensantes porque o delimitamos em convenção simplória (atavismos) sugerindo que tudo é imitação, e é como nos comportamos: imitando o outro até a morte. Claro que um médico pensa diferente dum engenheiro, se quisermos raciocinar com diferenças. Mas, fundamentalmente, são seres humanos forjados do modo de sempre no mundo animal (racional e irracional). Mas, se o animal não pensa em nada, também nós, humanos, evitamos pensar no absurdo de o nosso planetinha gravitar num sistema tão minúsculo em relação à Via Láctea que nem dá para imaginar que são bilhões de bilhões de Galáxias no Universo infinito. Ou finito?... Ah, quem somos nós?...

Com efeito, não há como não nos descambarmos ao espanto ante o absurdo. E talvez o maior de todos resida no fato de nos situarmos dentro de nós mesmos e nos deliciarmos com o que designamos subjetividade. Vemos coisas e pessoas e as distinguimos segundo nossa aparente vontade. Parece que é o que nos basta, até que miramos o céu distante e nos damos conta de nossa insignificante pequenez diante de nossa absurda existência, se é que existimos...

Bem, não posso negar certa angústia ante a vida e o mundo. Espanta-me o absurdo da ignorância em que vivemos. Não somos nada mais que hipóteses improváveis até materializarmos a hipótese extrema da inexistência: a morte. E mais ainda me espanta a arrogância, o extremismo fanático e a crueldade dos seres humanos, mesmo certos de que, humildes ou arrogantes, sensatos ou extremados, ricos ou pobres, tornar-se-ão pó de estrela tais como no início de tudo... Ou antes do início de tudo.


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